130 mortos pra nada: apreensão de drogas menor que do primo do Nikolas e armas do vizinho do Bolsonaro.

Mais de 130 mortos em um único dia no Rio de Janeiro. A polícia chama de operação, mas a favela chama de massacre. Corpos no chão, lençóis coloridos cobrindo sonhos interrompidos. 💔 Enquanto isso, apreensão menor que a do primo do Nikolas Ferreira e menos armas que as achadas com o vizinho do Bolsonaro. A guerra continua sendo contra o povo preto e pobre.

BLOGBRASILCRONICAHISTORIA

FAVELADO PENSANTE

11/4/20255 min read

Meus mano e minas, vamos falar francamente, com propósitos e com verdades. O que aconteceu no Rio não foi operação: foi massacre. Não dá pra chamar de outra coisa quando o Estado entra na quebrada como quem chega com uma notificação de condomínio e volta com mais de cem corpos no porta-malas da história. Essas operações em que mais de 130 pessoas foram mortas em bairros do Complexo do Alemão, Penha e Vila Cruzeiro, famílias inteiras viraram estatística na manchete.

A gente sabe que tem que combater drogas e armas, isso é fato, ninguém aqui quer ver mais famílias perdidas pelas drogas, mais criminalidade ao nosso redor, mais crianças sendo aliciadas, mas a pergunta que não saí da cabeça é: isso aí resolveu o problema? Será que, depois desse banho de sangue, os condomínios dos “boy” ficaram sem drogas? Será que diminuiu a economia do tráfico nos prédios chiques? A real é que essas operações só abrem espaço, espaço pra ódio, espaço pra vingança, espaço pra recrutamento. Pesquisas sobre a segurança pública já é rotineiro e é a mesma coisa no resultado final sempre: polícia militarizada e operações de impacto não provam reduzir crime a médio e longo prazo, e ainda corroem a confiança da comunidade.

Quer número pra não parecer papo? No Brasil, as mortes por intervenção policial têm números escandalosos: em 2023 foram mais de 6 mil pessoas mortas por ações de agentes de segurança, isso é quase uma cidade inteira perdida só por “ações de polícia”. A conta não fecha: o país prende, mata, prende de novo, e a violência volta a subir como se nada tivesse sido aprendido.

E tem mais: essa violência não é distribuída igual. Quem toma bala é preto e pobre. Relatórios de direitos humanos mostram que pessoas negras têm três vezes mais chance de serem mortas pela polícia do que pessoas brancas. Não é coincidência, é padrão. A descarga letal que a gente viu nas favelas tem um rosto e um sobrenome: a cor da pele.

Agora segura essa contradição que a mídia e a política fingem que não existem: enquanto a quebrada vira vala comum, sempre (e nem é exagero, é sempre mesmo) a apreensão grande, de drogas ou de armas, acontece em lugares ou em mãos com ligação com políticos e ninguém aqui vê corpos nesses casos. Lembra do primo do deputado Nikolas Ferreira que foi preso com mais de 30 quilos de maconha? Foi notícia, claro, mas o tom é outro, e a comparação é o que pega: a operação que matou mais de 130 pessoas fez apreensões que, olhando frio, não chegam perto do que foi encontrado em outros flagrantes particulares. Não tô inventando, tô citando o que saiu na imprensa.

E tem o episódio daqueles 117 fuzis, a maior apreensão registrada no Rio, encontrada na casa que tem ligação direto com Bolsonaro e com outros grupos com nomes conhecidos na política e no submundo. Isso deu manchete, mas é minimizado, viram até vítimas, ou a desculpa de sempre aparece, é perseguição, depois segue a vida normalmente, pode até ser preso, mas em menos de um ano já estão em prisão domiciliar em mansões de origem duvidosa. Repara: quando o alvo é o “preto” ”o favelado fudido”, a resposta é chumbo; quando é gente com sobrenome ou ligação a pessoas grandes e ricas, a saída costuma ser processo, investigação, silêncio. Isso é seletivo demais, rapa.

Então qual é a saída? Matar jamais deveria ser cogitado, em todas as religiões, ou fora delas, o bom senso deveria ser que ninguém tem o direito de tirar a vida de outro (lógico que menos em casos de legítima defesa). Matar só produz duas coisas: 1- enterra uma família e 2- abre vaga no mercado do crime. As facções e o tráfico são mercado, se você elimina um soldado, outro aparece. Pior: a morte cria órfãos de pai, crianças sem renda, jovens sem perspectiva. Quem banca o prato da casa some e quem recruta aparece com proposta “trabalho e família” disfarçada. O Estado que acha que sanguinário é solução está plantando o próximo lote de fuzis. Estudos sérios e programas da prática mostram que a saída de verdade é investimento social, interrupção de violência com base comunitária e retomada de confiança. Programas tipo Cure Violence, que usam interrupção de conflito, agentes de rua da própria comunidade e mudança de normas, já mostraram redução de tiros e homicídios em vários lugares. A ideia é simples: trata a causa e não só o sintoma.

Isso não quer dizer “sem polícia” (pode ser sem a PM) mas quer dizer polícia com inteligência, responsabilização e controle. Quer dizer política pública: emprego, escola que segura a juventude, acolhimento pra quem saiu do sistema prisional, atendimento psicológico pras famílias, justiça eficaz que não mata por espetáculo ou voto. Onde isso foi feito direito (e não é mágica, é projeto longo) a cidade ficou mais segura sem precisar de chacina. Alguns exemplos de interrupção de violência, apoio hospitalar a vítimas e programas de reabilitação mostraram queda de homicídios em diversos lugares, diferentes países e são programas testados internacionalmente. Não é utopia, é prática.

E tem outro ponto que ninguém gosta de dizer na mesa de bar com um vereador: toda ação que vira espetáculo eleitoral tem cheiro de política suja. Quatro policiais mortos também são tragédias, e merecem investigação e justiça, mas trocar voto por sangue é crime moral. Não dá pra aceitar que vidas sejam moeda de campanha. A política que naturaliza isso é a mesma que depois lê a estatística e chama de “resultado”. Não é resultado, é extermínio, já vimos isso em outro momento, com o bigodinho e o catavento.

No fim das contas, vamos falar francamente entre nós: a quebrada não quer bandeira de ódio, quer solução que dê futuro. Quer filho na escola, não no serviço de entrega de drogas; quer emprego, não aliciamento; quer saúde, não necrotério. E, enquanto o Estado achar que resolver é “entrar atirando”, vai ter cada vez mais mãe no velório e menos churrasco na laje. A política de segurança precisa mudar de direção: menos tropa de choque nas ruas e mais política social nas quebradas. Mais vizinhança forte, menos guerra declarada contra a própria população.

Fechando aqui, não esquece desses números quando a televisão mudar o tom. Não deixa em esquecimento as famílias dos 130, dos 4 Policiais, das crianças sem renda. Não troque voto por vida. E quando ouvir que “a operação foi um sucesso”, pergunta se Alphaville tá com menos drogas? Se as Raves estão sem drogas, se os bandidos estão sem armas, onde estão os presos com sobrenome famoso, porque deputados como Roberto Jefferson que atirou, jogou até granada na polícia, não foi morto? Quantos fuzis foram mesmo achados em casas ligadas a gente do poder, a familiares de políticos e quantas famílias foram enterradas enquanto a propaganda dizia “ordem pública”. A luta é por memória, por justiça, e por um jeito de cuidar da quebrada que não passe por massacre